O ser humano se comunica a todo o tempo. No trabalho, em casa, na rua com estranhos. A comunicação é uma habilidade imprescindível para a vida em sociedade e ela tem uma parcela considerável de responsabilidade pela sobrevivência da nossa espécie. Mas como você se comunica? A Comunicação Não-Violenta (CNV) é uma forma de interagir de maneira respeitosa e empática, tanto com o outro, quanto consigo mesmo.
A Comunicação Não-Violenta pode ajudar muito qualquer tipo de relacionamento interpessoal. Família, amigos, trabalho, todo tipo de convivência pode se beneficiar aplicando os conceitos da CNV.
Entenda o que é esse tipo de comunicação e como utilizá-la no ambiente de trabalho.
O que seria uma comunicação violenta?
Antes de entendermos a Comunicação Não-Violenta propriamente dita, vale entender o que é uma comunicação violenta. Quando nos expressamos através de julgamentos, rotulamos as pessoas, e nos dirigimos aos outros de forma agressiva, estamos sendo violentos em nossa comunicação.
Uma linguagem violenta tem como foco apontar o que entendemos como erros alheios, em busca de “ter razão”. Porém, há várias formas de se comunicar, para além da linguagem verbal. Dessa forma, um olhar, um gesto, ou até mesmo um silêncio podem ser formas violentas de se comunicar.
O que é e como surgiu o conceito de Comunicação Não-Violenta
A Comunicação Não-Violenta é uma forma de se comunicar de maneira respeitosa e empática consigo mesmo e com o interlocutor. O conceito foi formulado pelo psicólogo estadunidense Marshall B. Rosenberg.
Ele compartilhou sobre o tema no livro “Comunicação não-violenta: técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais” e também tratou do assunto em “Vivendo a comunicação não violenta: Como estabelecer conexões sinceras e resolver conflitos de forma pacífica e eficaz”.
A CNV propõe formas de comunicar a fim de evitar e/ou solucionar conflitos. Mas não é uma ferramenta centrada apenas no outro, mas respeita também os desejos e necessidades de quem está comunicando. Além disso, a CNV incentiva as pessoas a falarem sobre suas necessidades também e não silenciar para evitar conflitos, mas a fazê-lo de maneira respeitosa.
A CNV tem 4 componentes importantes para a sua execução.
4 componentes da Comunicação Não-Violenta
1 – Observação
Nesse momento você deve olhar o acontecimento com imparcialidade, sem julgamentos ou qualquer sentimento em relação ao que que aconteceu. Suponhamos que você chega em casa e seu companheiro não lavou a louça na pia, como você esperava. Na observação, você olha para o fato que é: as louças estão sujas na pia e não “meu companheiro não lavou a louça”.
Percebeu como na segunda constatação há julgamento? A partir do momento que você adiciona o componente do seu companheiro, você está definindo que ele ou ela deveria ter lavado a louça e o fato que qualquer um pode comprovar quando chegar em sua casa é que há louça suja sobre a pia.
Por que é importante observar sem julgar
A partir do momento que você chega em sua casa e diz: “você não lavou a louça”, você percebe que as chances de seu companheiro lhe ouvir diminuem? Isso porque ele ou ela se tornará reativo e já começará a preparar sua defesa. A partir desse momento, a conversa torna-se mais um julgamento, na qual um é o advogado de acusação e o outro de defesa (de si mesmo).
2 – Sentimento
Segundo Rosenberg, você precisa identificar o sentimento que o acontecimento causou em você. O que você sentiu quando chegou em casa e viu a louça suja? Raiva? Tristeza? Irritação? Desânimo? É importante que você identifique e nomeie esses sentimentos.
Um ponto que o autor traz é que a maioria das pessoas confunde sentimento com opinião. Quando alguém pergunta como a pessoa está se sentindo, são comuns respostas como: “sinto que tudo deu errado”, “sinto que fulano me desrespeitou”. Essas respostas não trazem sentimentos, mas pensamentos (muitas vezes com julgamentos embutidos).
Respostas “corretas” seriam “sinto-me inseguro”, “eu me sinto triste”, ou “sinto-me desanimado”. Identificar os sentimentos é a chave para reconhecer as necessidades que o indivíduo tem no momento.
3 – Necessidades
Quando identificamos nossas necessidades e as comunicamos ao outro, as chances de uma conversa produtiva em torno de soluções são bem maiores. Nesse sentido, a Comunicação Não-Violenta está longe de ser uma incentivadora de “engolir sapos”, muito pelo contrário. Falar de suas necessidades para o outro é uma atitude que os adeptos da CNV encorajam fortemente, porém de maneira adequada e respeitosa.
Utilizando mais um exemplo hipotético, imagine que duas pessoas estão planejando uma viagem juntas. Uma quer sair de casa à noite, a outra prefere sair pela manhã. Um caminho (talvez o mais comum, infelizmente) seria uma troca de acusações. “Você é irresponsável”, “você é preguiçoso”, “você é muito ansioso”, ou quaisquer julgamentos que um possa querer fazer ao outro naquele momento tenso.
O que a CNV orienta é que cada um identifique a necessidade que o levou a querer sair de casa à noite ou pela manhã, nessa situação. Quem escolheu sair à noite pode estar necessitado de segurança e previsibilidade. Já a outra pessoa, que prefere sair pela manhã pode ter a necessidade de descanso. Quando essas duas pessoas conversam com respeito, sem julgar ou acusar, demonstrando quais necessidades precisam que sejam atendidas, a conversa tem muito mais chances de ser proveitosa.
4 – Pedido
Essa parte é difícil para muita gente. Muitas vezes não queremos fazer um pedido, por medo de parecermos inferiores, ou para não incomodar o outro. Mas essa atitude é nociva para aquele que prefere não falar e para as pessoas que estão ao seu redor. A pessoa que guarda consigo seus sentimentos e necessidades não atendidas, tende a se tornar mais reativa, além de estar cometendo uma violência consigo mesma.
O pedido precisa ser claro e bem específico, e o outro tem a opção de atender ou não. Ou seja: é preciso estar aberto para a possibilidade de uma negativa, caso contrário não seria um pedido, mas sim uma exigência, o que não é o objetivo.
Para fazer um pedido é importante entender as necessidades que precisam ser atendidas, para saber exatamente o que pedir.
Como aplicar a Comunicação Não-Violenta no trabalho
A CNV não é fácil de ser colocada em prática. A sociedade é muito pautada em julgamentos e rótulos, e é difícil se desvincular disso. Porém, quando se opta por adotar essa abordagem nos relacionamentos interpessoais, todos só têm a ganhar.
A prática leva ao hábito, e quando se pratica todos os dias os conceitos e componentes da CNV, isso se torna uma rotina. Segundo Marshall Rosenberg, há 3 fatores essenciais para a adoção da CNV: 1)compreender o que se passa dentro de nós, 2) uma comunidade de apoio e 3) muita prática. Quando falamos em comunidade de apoio, podemos pensar em uma adoção da CNV por parte de toda a organização. Quando todos estão unidos no mesmo propósito, os resultados são muito mais fáceis de serem alcançados. Portanto, essa pode ser uma tarefa para os setores de gestão de pessoas.
Na prática, para começar, há um exercício de autoconexão indicado por Rosenberg, que tem como base os 4 componentes da Comunicação Não-Violenta.
- Observe a situação e a defina. Depois pergunte e responda sem julgamentos: O que realmente ocorreu?
- Analise os próprios sentimentos e dê nomes a eles, cuidando para não confundir sentimento com opinião.
- Perceba quais são as suas necessidades não atendidas no momento.
- Há algum pedido a se fazer, seja para você mesmo ou para o interlocutor?
Essa é uma forma de começar e, aos poucos você perceberá mudanças ao seu redor. Lembre-se sempre de ouvir o outro com empatia, despido de seus próprios conceitos, preconceitos e de julgamentos que não servirão para nada. Assim, a Comunicação Não-Violenta é sobre ver o outro e suas necessidades, respeitando e sendo empático, não apenas com o seu semelhante, mas também consigo mesmo.